Muitos benefícios, para poucos
Jornal da Tarde, 06/05/2001
Segundo estimativa da Organização Mundial da Saúde, aproximadamente 0,05% da população possui deficiência visual grave (baixa visão e cegueira), sendo que este total pode chegar a 1% em países subdesenvolvidos. Admitindo-se a hipótese de que a percentagem de 1% seja válida para o Brasil, a população de deficientes visuais graves chega a um milhão e 600 mil pessoas. É o público que a Escola Helen Keller se propõe a atingir. Apenas cerca de 1% dos deficientes visuais seriam potenciais usuários de cães guias – devido à necessidade da série de pré-requisitos para ser um virtual usuário de cão guia, segundo o instrutor Moisés Vieira dos Santos Júnior. Mesmo com a estimativa pouco ousada, 16 mil cegos poderiam, teoricamente, estar usando um cão guia no Brasil. Na prática, porém, apenas 16 pessoas com baixa visão ou cegueira o fazem. Oito delas vivem em Santa Catarina – cinco em Florianópolis, cidade sede da Helen Keller. O advogado e presidente da Associação de Corretores de Imóveis de Santa Catarina, Carlos Henrique Geller, o Caíque, 52 anos, está com seu Labrador Retriever desde 1997. Ele deu ao cão o nome de um colega que também é deficiente visual: Artur. O amigo – o massoterapeuta Artur Mantelli de 46 anos – retruca: “Pena que eu tenha uma cadela e não um cachorro. Senão, com certeza se chamaria Caíque”. Segundo Caíque, Artur, o cão, conhece mais de 20 trajetos. Ele só precisa ordenar que o cão o leve para o trabalho, para casa ou para bares e restaurantes que costuma freqüentar. “É incrível como esse cachorro gosta de bar”, brinca. Supercompanheiro Outro pioneiro no uso de cães guias no Brasil foi o professor e graduando de Pedagogia José Carlos Rodrigues, de 32 anos. Ele está com um Golden Retriever há três anos e quatro meses. Logo que soube da possibilidade de ter um cão guia, ele aceitou a idéia. “Gostei porque era uma coisa nova, e sou uma pessoa muito aberta”. Rodrigues trabalha com revisão de material didático em Braille junto à Fundação Catarinense de Educação Especial. Também viaja pelo interior de Santa Catarina fazendo palestras sobre deficiência visual e às vezes vai ao Rio de Janeiro a lazer. À noite, faz faculdade. Em todas as atividades, Ben o acompanha. “Ele é supercompanheiro. Se estou na sala, ele fica na sala. Se vou para o quarto, ele também vai. Não fica muito tempo longe de mim. Uma vez em que saí e passei a noite fora, ele nem dormiu. Minha mãe ficou até preocupada”. Uma das mais recentes usuárias de cão guia no Brasil é Zita Catarina Miglioranza, de 46 anos, que também trabalha com revisão de material didático na Fundação Catarinense de Educação Especial. Membro da última turma que viajou aos EUA para formação, Zita está com Eros, um Labrador Retriever, há apenas seis meses. “Estamos em fase de correção de pequenos erros”, comenta. “O Eros ainda quer parar para cheirar postes, arbustos e outras coisas, o que não deve acontecer com um cão guia”. A relação entre Zita e Eros, de acordo com os parâmetros do instrutor Moisés, encaminha-se bem. “Entre três e seis meses, os usuários percebem o que pode distrair o cachorro, e a correção tem de acompanhar o grau da distração”, diz ele. Ou seja: para pequenos erros, pequenas chamadas de atenção; mas, diante de erros mais graves do cão, é preciso ser duro. Entre seis meses a um ano de convivência entre o cão e o dono, diz o instrutor, a relação costuma dar um salto de qualidade; o entendimento mútuo cresce e a harmonia aumenta. “Nesta fase, dá-se uma espécie de clique na relação e tudo passa a ficar muito mais fácil”, garante. |
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